segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

ESTÁTUA DE SAL


ESTÁTUA DE SAL
Oswaldo Antônio Begiato

Então...
Não estranhe o meu andejar manco
de lá pra cá, de cá pra lá, sem muito critério;
sou apenas o luar insano e débil
se perdendo da lua;
a lua transviada no meio da poça
se perdendo da noite;
a noite embriagada de solidão
se perdendo do amor;
o amor se perdendo... Se perdendo!

Não me trate como se eu tivesse quinze anos.
Não se iluda. Tenho algumas eternidades,
e um monte de fotos a serem desvendadas
(de um semblante que encontrei enrugado
no reflexo proporcionalmente inverso
à imagem paralisada de meu rosto
amando a face oculta da lua, à meia noite.)
- Isso sim é perdição!

Estou aqui desde ontem
com a mesma roupa no avesso,
o mesmo sapato sem sola,
a mesma rua e a mesma esquina sem saídas,
os mesmos eclipses sem placas,
as mesmas corrosões velozes,
os mesmos medos fotografados,
e o mesmo olho inchado de tanto te olhar:
- É olhar-te em vão que tem me apequenado.

Então...
É que quando te olho me vejo dízima periódica;
cavalo de São Vicente:
- Carrega peso e não sente.
Sentimentos meus que os fatos iludiram.
Eles não têm mais importância alguma.
Eles não têm razão nenhuma para me furtar o sorriso,
mas eles fazem as lágrimas me beijarem palpitantes
as minhas horas mais frágeis.
Frágil, venho abaixo. Viro sal.

Não visses ainda que quando abotoas
no meio de meus confins
enche meus olhos de jardins
e meu coração de espinhos?
Ajardinado, vou-me fugaz... Sem olhar para trás.

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

FORASTEIRA


FORASTEIRA
Oswaldo Antônio Begiato

Eu nasci mulher
E mulher vou caminhar.

Com meus olhos sagazes,
Com minhas sardas censuradas,
Com minha boca enfeitada,
Com meus seios valentes,
Com minhas coxas atrevidas,
Com meu sexo forasteiro...

Eu nasci mulher
E mulher vou caminhar.

Com minhas pernas próprias.
Com minhas pernas sóbrias.

sábado, 21 de novembro de 2009


ROSA MENINA DOS OLHOS DE ROSA
Oswaldo Antônio Begiato

Foi quando me ofertaste doce a rosa;
- Rosa menina dos olhos de rosa -
E perdão pediste por ser menina
Nas ecos vazios da vida menina
Ofertando a mim, menino pequeno
No meu viver de menino pequeno,
A rosa menina mais só do mundo;
- Linda menina dos olhos do mundo -
É que me fizeste tão apaixonado,
Eu, menino do mundo, apaixonado
Por ti e por teus olhos cor-de-rosa;
- Rosa menina dos olhos de rosa.

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

PROMESSAS CUMPRIDAS


PROMESSAS CUMPRIDAS
Oswaldo Antônio Begiato

Venha ver o que, rara, nasceu ignota
Atrás de nossa casa velha e relha,
Em frente à varanda, ausente de nós,
Sob a sombra fria de nossas janelas.

Um pezinho inocente de margarida,
Pálida como a lua cheia no inverno
E frágil como as entregas ingênuas
Em noite de bem-me-quer dissimulado.

Por um instante completaremos o vazio
Que ficou no avesso do vaso colocado
Ao lado da foto de nossas promessas
Quando éramos esperanças mútuas.

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

ALTIVEZ


ALTIVEZ
Oswaldo Antônio Begiato

Depois de percorrer
meus pensamentos confusos,
rebentado e escasso,
termino de escrever
a poesia nova,
rebento indócil
que me rasga todo dia.
Olho pra ela e dela rio. Sem muita razão.

E quando vou repousar
deixando-a no livro aberto
de quem a lê sem sofrimentos
com os olhos gordos,
ela livre e de ninguém,
fica toda cheia de zombas.
Olha para mim e de mim ri também. Com razão.

Deixamos assim
os pratos da balança
no mesmo nível. E o fiel com ciúmes.

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

RODA GIGANTE

Esta foto a poesia ganhou da poeta Ana Paula Perissé.

RODA GIGANTE
Oswaldo Antônio Begiato

Busquei-te na eternidade
Que o tempo esconde
Nas entrelinhas do instante,
E só fui te encontrar,
Segundos adiante,
No meio de uma festa alheia,
Dançando sozinha, alheia,
Com tua cadeira de rodas
Como se a existência fosse
Uma roda gigante iluminada
Girando em falso.
E tu, a Senhora do Espaço,
Inconsumível,
Ilimitada.

terça-feira, 3 de novembro de 2009

CHAMADO





CHAMADO
Oswaldo Antônio Begiato

Aqui no
Sul
Tem um
Sol
Que é só
Seu.

Venha!

Aqui tem
Céu,
Sempre
Cio
E pouco
Sal.

Venha!

Aqui eu
Sou.

Tenha!

segunda-feira, 26 de outubro de 2009


NOSSOS OSSOS
Oswaldo Antônio Begiato

Quando me avisto
- ocluso e escuro -
polindo impávido
tua prata e teu ouro
fico a pensar se a espécie
de porcelana fina
com que me modelaram
não foi a feita com a cinza
de meus ossos
que o tempo exumou.

Quando me desespero
- recluso e confuso -
apalpando pávido
minhas vias e minhas veias
descubro a espécie de amor
com que me forjaste:
- Aquele, cheio de afetos,
feito com a lágrima
que te lavou e me levou
a morrer de saudades
quando morreste tu
de amor por mim.

Partiste tão sem demora
que nem pude eu fazer
das cinzas de teus ossos
a porcelana única e alva
para fundir-te altar
onde eu queria ver
entronizado meu amor por ti
- meu imorredouro amor por ti -
no supremo sacrário
de nossas rendições.

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

sábado, 17 de outubro de 2009

CONTRADANÇA


CONTRADANÇA
Oswaldo Antônio Begiato

Te quero rubra
Te fazes branca
Te quero branca
Te fazes água
Te quero água
Te fazes jóia
Te quero jóia
Te fazes mulher

Te quero rosa
Te fazes nuvem
Te quero nuvem
Te fazes solo
Te quero solo
Te fazes vôo
Te quero vôo
Te fazes mulher

Te quero brisa
Te fazes vácuo
Te quero vácuo
Te fazes sopro
Te quero sopro
Te fazes vida
Te quero vida
Te fazes mulher

Te quero carne
Te fazes sonho
Te quero sonho
Te fazes pele
Te quero pele
Te fazes cheiro
Te quero cheiro
Te fazes mulher

Te quero rasa
Te fazes poço
Te quero poço
Te fazes seca
Te quero seca
Te fazes doce
Te quero doce
Te fazes mulher

Te quero terna
Te fazes vulcão
Te quero vulcão
Te fazes neve
Te quero neve
Te fazes fogo
Te quero fogo
Te fazes mulher

Te quero fênix
Te fazes cinza
Te quero cinza
Te fazes cheia
Te quero cheia
Te fazes colo
Te quero colo
Me fazes homem

terça-feira, 13 de outubro de 2009

PÉTALAS PLENAS


PÉTALAS PLENAS
Oswaldo Antônio Begiato

Leve meu peso leve
No teu cair descuidado
E me deixes vulnerável.

Serei, a ti, eternamente grata
Por teres chovido pedra
Nas minhas pétalas.

Pode agora a luz me atravessar sem dor.

Sou, sem ser efêmera, fêmea incólume.

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

FORA DE PRUMO


FORA DE PRUMO
Oswaldo Antônio Begiato

Não quero ser
linha reta!

Não quero estar
no prumo.
Não quero estar
no nível.

Quero ser curvo!

terça-feira, 29 de setembro de 2009

TANTO É


TANTO É
Oswaldo Antônio Begiato

Tanto é
Que estou aqui de mãos postas,
Pernas em genuflexão e olhos alagados
Fingindo rezar uma prece de luz em plena obcecação.

Tanto é
Que não sei o fuso horário;
O dia, o mês e o ano em que estou pulsando.
Fiquei atemporal, sem medidas e incorpóreo. Intangível.

Tanto é
Que não tenho residência fixa.
Não tenho cadastros. Não tenho verdades.
Carrego somente as sombras que me conspurcaram.

Tanto é
Que já ultrapassei minha permanência,
Diluindo-me em partidas intolerantes à volta.
Não penso e não existo mais. Sou espectro. Fio de vida.

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

EU TE DESEJO UM SONHO


EU TE DESEJO UM SONHO
Oswaldo Antônio Begiato

Desejos são coisas simples:

Andar de mãos dadas no meio da noite,
Fazê-la parecer nunca terminar
Enquanto estrelas travessas nos espiam
Remexendo com suas pontas ligeiras
Nossos corações distraídos;

Colher flores amarelas amadurecidas no campo,
Ataviar teus cabelos longos e leves
Enquanto o vento os toca com suavidade
Embalando nossas secretas
Vontades de perdição eterna...

Sonhos, porém, são mais complexos;
Eu por exemplo sonho te fazer feliz.

Viu como é complexo?