segunda-feira, 30 de julho de 2012

FANTOCHE

FANTOCHE
Oswaldo Antônio Begiato

Levai,
ó vento, levai
as folhas secas
de lá pra cá,
de cá pra lá,
assim como
o tempo leva,
as horas inúteis,
de cá pra lá,
de lá pra cá,
incansavelmente.

Levai,
ó tempo, levai
meu viver fatigado
para outras garras,
por outros amores,
assim como
o vento leva
o pó de minha carne
para outras terras,
por outros mares,
irremediavelmente.

Levai,
ó vento, levai,
pelos cordéis do tempo,
os movimentos desajeitados
de meu corpo já exaurido pela dor
para bem longe dos olhos
de minha gente;
para bem longe da história.

Levai, ó vento, levai.
Levai, ó tempo, levai.



sábado, 21 de julho de 2012

GOTAS

GOTAS
Oswaldo Antônio Begiato

Sou uma gota
d’água;
trago dentro de mim
- céu de rosas que sou -
muitas tormentas.

Sou uma gota
de vinho;
trago dentro de mim
- barril de pólvora que sou -
várias verdades.

Sou uma gota
de lava;
trago dentro de mim
- cratera de cálice que sou -
lágrima e sangue.

segunda-feira, 16 de julho de 2012

SEM PALAVRAS


SEM PALAVRAS
Oswaldo Antônio Begiato

e quando olharam para mim
dizendo que eu estava com saudades
saudades de momentos passados
esperando que eu nada negasse
eu ria
apenas ria uma desatenção desbotada
pelo avesso da lembrança doída

eu ria
apenas ria uma vergonha cândida
destas que buscam conceitos abstratos
para os caminhos virgens da vida
e vai deixando enigmas
pincelados nas cercas
como sói que seja
nesses casos de saudades
de saudades
de uma verdade inventada
de dentro da qual partimos
sem nada deixar
sem nada levar

terça-feira, 10 de julho de 2012

INCORRIGÍVEL BOEMIA


INCORRIGÍVEL BOEMIA
Oswaldo Antônio Begiato

os botequins
sempre abrem
abrem e fecham
fecham e abrem
os botequins
sempre
e sempre
e sempre...

e sempre há neles um cantor
com o sentimento ferido
e o coração rasgado
pelo cutelo do abandono
cantando e cantando e cantando
a canção que não se deixa findar

diferentemente de mim
que sou apenas um pobre ouvidor
e vivo reclamando da vida
horas e horas a fio
quase sempre embriagado
sentado à mesa amargurado
ouvindo e ouvindo e ouvindo
a canção que não pode se findar

domingo, 1 de julho de 2012

PALAVRAS MUDAS


PALAVRAS MUDAS
Oswaldo Antônio Begiato

Quando você vier
apontar minhas lástimas
traga gestos calmos,
traga gestos claros,
traga gestos castos.

Quando você vier
preparar minhas cinzas
traga um quilate de ouro,
traga um ramo de mirra,
traga um frasco de incenso.

Quando você vier
encomendar minhas crenças
lembre-se de que sou
torto,
empertigado em urna de ouro;
louco,
enfeitado com folhas caducas de mirra;
poeta,
ungido com fragmentos de incenso.

Quando você vier
retalhar minha existência
traga o silêncio dos tortos,
traga o silêncio dos loucos,
traga o silêncio dos poetas.

Quando você vier
lacrar o túmulo de minha carne insepulta,
traga palavras mudas e nada mais,
pois meus versos necessitam de silêncio.